27 de mai. de 2015

Da raiz do baobá

A Casa França Brasil abrigou, de setembro de 2014 a janeiro de 2015, sessões de contação de histórias.

Narrativas que contam sobre origens, sobre idas e vindas, e as relações com a cidade do Rio de Janeiro.

Participei do projeto com "Da raiz do baobá". Baseado em narrativas orais sobre mitos acerca das árvores Baobás e sua relação com a literatura oral, o trabalho conta sob o ponto de vista de uma semente de baobá, o translado de uma menina africana, na época do tráfico de escravizados, e sua chegada ao Brasil, culminando com sua vontade retornar às raízes do Baobá.

Fiquei extremamente emocionada por contar essa história ali na Casa França Brasil, arquitetura que, segundo narrativas históricas, também foi porto de chegada de escravizados, e sentir todo o abraço do centro histórico do Rio de Janeiro, palco em que as culturas africanas se entremearam em território brasileiro.

Pude repetir a contação na Escola Politécnica da FIOCRUZ, nas suas celebrações do mês da Consciência Negra. Mais emoções.

E vamos seguindo semeando as sementes do respeito com beleza.

Imagens de Pedro Agilson.






11 de mai. de 2015

Aldeia de Histórias

Aprender e confirmar o apoio às causas indígenas. Essas oram minhas experiências com o projeto Aldeia de Histórias.


Ao longo do mês de abril, foram partilhas com muitas turmas de escolas e projetos educativos no Museu do Índio.



A convite do grupo Poesia Viral, idealizador do projeto, além das centenas de etnias presentes no Brasil, pude conhecer mais da profundidade das narrativas guaranis, ouvindo o afetuoso Algemiro Poty e generoso Alberto Álvares, que compartilharam conosco o espírito e os sentidos que fundamentam as histórias que lemos registradas em livros.




Cada vez mais confirmo meu desejo de trabalhar aliada às poéticas ancestrais, estejam elas aliadas ou não ao contemporâneo.









5 de jul. de 2014

Os sete novelos

Tive o prazer de contar Os sete novelos na Biblioteca Pública Estadual, no Centro do Rio de Janeiro.









Uma história que gosto muito e que está mediando a exposição artevida, que mostra o acervo/performance de Paulo Bruscky, artista que admiro muito.

A rede de auxílio entre as pessoas via arte postal foi meu mote para a escolha de Os sete novelos, o reconto sobre os sete irmãos briguentos que recebem como herança de seu pai o desafio de transformar sete novelos em ouro!





Gostoso foi depois da contação, convidar as pessoas a compartilharem escritos ou imagens a partir da pergunta 

"Se das suas palavras dependesse uma vida, o que você escreveria? Pra quem seria?"

Fiquei muito feliz e emocionada pela resposta e participação de todxs, adultos e crianças, e, sobretudo, da simplicidade e força de suas mensagens.

É muito bonito tocar as pessoas através do que se escolhe ser e fazer na vida.



13 de jun. de 2014

Sobre todos os dias

Ruth de Souza, Léa Garcia, As Mães de Maio, Lélia Gonzales, Zezé Mota, Rainha Njinga, Beatrice do Congo, Mãe Menininha do Gantois, Mãe Beata de Iemanjá, Ivonete Cândida de Paula, Mãe Stella de Oxum, Tia Ceata, Xica da Silva, Claudia Silva Ferreira, Tia Maria da Serrinha... Carolina de Jesus.

A partir do chamado do 9° Sarau das Artes - ETET Martins Pena, em homenagem à grande dama do Teatro Brasileiro, Ruth de Souza, o NUPEMP (Núcleo de Pesquisas Étnicas - ETET Martins Pena) se inspirou nas mulheres negras de muitas épocas e lugares. Mães, guerreiras, rainhas, políticas, artistas, sacerdotisas, donas de casa, dentre tantos outros papeis. E é para celebrar o papel que também celebramos a escritora Carolina de Jesus, no ano de seu centenário (14 de maio de 1914).

Carolina transforma a sua relação com o papel: de catadora torna-se poetisa. Respeitada por escritores como Clarice Lispector, sua escritura nasce de sua vivência de mulher, mulher preta, mulher preta e pobre, mulher preta e pobre e moradora de favela. Os cheiros, os sabores, os lugares, as pessoas, o racismo: todas as experiências vividas e escritas na sua pele foram material para sua escritura.

Em "Sobre todos os dias", o NUPEMP selecionou fragmentos de livro "Quarto de despejo", entremeando-os às sonoridades e corporeidades das iabás, as orixás femininas do Candomblé, mais conhecidas: Nanã, Iansã, Oxum e Iemanjá.

"Sobre todos os dias" é uma experiência com o público sobre todos nós, sobre todas as mulheres e sobre todas as mulheres negras.

Concepção: Profª Vera Lucia LopesMauricio Lima, Tatiana Henrique, Verônica da Costa
Performance: Di Santos, Tatiana Henrique.
Fotos: Pedro Henrique Dias.







29 de abr. de 2014

"Cabeça de Vento" reestreia no Teatro Glaucio Gill


Queridxs,

neste fim de semana começa a nova temporada de Cabeça de Vento, da Pandorga Cia de Teatro.



O espetáculo completa dois anos de existência, tendo recebido ao longo desse tempo diversos prêmio e indicações. (veja aqui)


​​Olha só o que algumas pessoas andam soprando aos ventos:


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"O maior mérito do espetáculo é tratar de um assunto considerado tabu, de uma forma sensível e singela, não menosprezando a inteligência da criança. Resgata também a construção de brinquedos caseiros, como a confecção de pipas, mostra a mãe fazendo flores com papel de seda e presenteando o filho com um livro. Isso
é muito importante, pois nos dias de hoje, a criançada só quer saber de “videogames”." - Venício Angelici

"Apesar de se tratar de um fato relacionado com o passado do garoto, a peça não se torna nostálgica, e sim lúdica, pois traz o pai em determinadas cenas e consegue trabalhar com o passado e o presente sem gerar confusão. Cabeça de vento mexe com a imaginação do espectador. Isso acontece porque, além de um texto e atuação adequados, os atores movimentam módulos de bambu do cenário durante a peça." - Camila Gasparini 


"Somos contemplados com sotaques franceses e chineses em meio às descobertas do menino-protagonista, muito bem estruturado, diga-se de passagem. Brincar. Como não sair do teatro com esta vontade. Acompanhar o protagonista através de suas aventuras atemporais é um programa formidável e, no fim, talvez sintamos sutilmente uma sensação de saudade da figura paterna." - Bruno Dias

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Estaremos no Teatro Glaucio Gill, aos sábados e domingos, 17h, de 3 de maio a 1° de junho.





26 de abr. de 2014

Contação de histórias - uma linguagem em desenvolvimento na contemporaneidade

Presenciamos, querendo ou não, a emersão de um novo gênero em Artes Cênicas: a Contação de Histórias.


O ator Sotigui Kouyatê, reconhecido internacionalmente por seus trabalhos junto a Peter Brook, afirma que em seu grupo étnico, no Burkina Faso, existe o costume de, quando na chegada de um forasteiro, as pessoas reunirem-se ao redor dele, para que este conte sua história e sobre o lugar de onde veio e pelos quais passou.



É uma maneira de conhecer o mundo através da experiência de uma outra pessoa, através de seus olhos, através de seus sentimentos ao contar a história.


Aliás, na língua de origem de Sotigui, não há diferenciação filosófico-etimológica entre Teatro e Contação de histórias, essas experiências significando realmente, em português, "conhecer o mundo".


Se voltarmos ao Ocidente, vamos lembrar do gregos dizendo "conhece a ti mesmo". Não podemos esquecer que seu teatro pedagógico é a base para muitas outras teorias de Teatro no ocidente. Mas, com relação à Grécia, é uma outra beleza que se traz aqui: a palavra Teatro.


Esta é derivada de Theatron, "lugar de onde se vê". Logo, percebe-se: a dimensão da platéia já era encarada como essencial ao fenômeno cênico. Claro, posto que os elementos colocados em cena, somente o são a fim de serem mostrados à platéia (independente de serem objetos simbólicos ou de cunho realista). É a ela que interessa o visível do ato cênico. E a Contação de histórias tem muito a ver com isso.


Quebrando os limites da quarta parede, a Contação de histórias vem a se encontrar com o Teatro que conhecemos em uma característica essencial aos dois: o compartilhamento de experiências.


Mesmo que não haja elementos cênicos, que a voz e o corpo sejam os pilares da performance, existe a criação de um espaço cênico subjetivo, aberto às realizações cognitivas de cada indivíduo que forma o ser “platéia”.
E se a quarta parede aqui é citada, não o é em vão: o seu rompimento é afim ao Zeitgeist contemporâneo: o intertexto, o interdiscurso das linguagens artísticas.


Chegamos a um ponto em que, não só em Artes Cênicas, mas também em Artes visuais, por exemplo, os gêneros se cruzam, contribuindo-se mutuamente. Estes cruzamentos permitem uma característica interessante: os gêneros formam híbridos descolantes, ou seja, podem tornar a ser o que eram antes e tangenciarem outros gêneros.


Logo, a transposição da quarta parede de entre atuador (ator e/ou contador) e platéia para além desta, cria um campo em que ambos os papéis aqui citados se interpolem em seus lugares, ora público tornando-se líderes do discurso, ora este devolvendo esse lugar ao atuador.


Porém, subsiste uma questão: tornar o público líder de um processo artístico não é desautorizar a criação individual do atuador? Entramos no ponto mais belo dessa relação.


Não nos enganemos: um espectador, ao se colocar nessa posição, quer, espera, expecta, algo que o alimente de algum modo, mesmo que não saiba que texto e direcionamento cênico o aguardam. O contador de histórias conhece esse fenômeno e vai se utilizar dos quantos fios estiverem disponíveis à essa realização.


Daí a necessidade, e a abertura possível, de se transformar textos, sejam mitos ou literários, a uma poética atual, de acesso franco ao espectador. Similar à pedagogia teatral bretchiana. Se o atuador o faz é por sentir essencial a criação de diálogos, não só entre ele e o espectador, mas entre este e a história, tornando sua figura um meio cênico, assim como um aparato cenográfico o é.


Um ponto importante a se destacar consiste em que criar espaço comum ao espectador e o texto não é de forma alguma transformar a história em algo digerível, digerido, destituindo-a de jogos polissêmicos. Criar espaço comum é considerar o público como capaz de se tornar sujeito no espaço cênico, oferecendo-lhe subsídios, mesmo que apenas de natureza cognitiva, para interferir no apresentado a ele.


A beleza do espaço dialógico está em o próprio indivíduo espectador digerir com seu suco gástrico/cognitivo a história que se medeia a ele. O papel do contador é o de simplesmente criar diálogo, de ser um mediador. Sem ele, o público sai do espaço da história, da contação, o mesmo que entrou. Será mesmo?


Em uma entrevista, Clarice Lispector, quando perguntada sobre o que esperava mudar com os seus textos, disse: "Nada. Não acredito que a Literatura possa mudar nada".


Nada. A história, a Contação de histórias, não muda nada.


Acrescenta. A Contação de histórias (leia-se aqui todos os gêneros cênicos e de outras artes) acrescenta sentidos, percepção, criação.


Principalmente na contemporaneidade, quando a sociedade ocidental oferece ao indivíduo um número ínfimo - contável nos dedos de uma mão, talvez - de ritos de passagem.


Contação de histórias é um rito de passagem. É um lugar, físico e afetivo, seguro, em que o ser é tomado por experiências outras, as quais osmoseifica como suas.


E não era o rito de passagem para os povos antigos um processo de educação? De natureza étnica, sim (como se a ocidental não o fosse); mas de educação, prioritariamente.


Educação étnica, educação estética, educação ética.


Para cada rito, uma história. Cada história uma explicação do universo. Como necessitamos conhecer o mundo a nossa volta ainda nos nossos dias...


Como ainda necessitamos, e não só as crianças, mas os adultos acima de tudo, de reconhecer nas histórias de outros povos espelhos de nós mesmos, independente das cores, deuses e construções que compõem nossas vidas.


Como precisamos perceber a beleza do outro: a beleza da pele, a beleza da oração, a beleza de seus templos.


Como precisamos nos perceber em uma dimensão planetária.



As histórias têm esse poder: transformar diferenças em tolerâncias.


Contudo, há de se alertar: a contação de histórias, ou qualquer outro gênero artístico, enquanto instrumento pedagógico não o é assim para a massificação, mas para a educação do indivíduo.


Esteja direcionada a adultos ou crianças, não se presta a apaziguar os ânimos, ou para criar estados de alegria acéfala, mas para instigar estados de apreciação estética, como os sugeridos por Jauss: poiesis, aisthesis e katharsis.


Sugere-se, no entanto, que esta trindade receptiva seja imagina não de forma linear ou triangular, mas como um círculo, uma espiral, posto que, após katharsis, inexoravelmente poiesis retoma seu lugar reorganizatório, resultado da experiência fruída pelo espectador e, como a própria significação etimológica sugere, constituindo-se como o processo de criação, o indivíduo tomado pelo gênio (re)criativo da obra apresentada a ele, o fruidor que se torna co-autor da história.


Retomamos, finalmente, a idéia anterior: o espectador, ao se colocar nesta posição espera, expecta, por algo que o alimente. Expecta pelo fenômeno, isto não para a pedagogização de seus sentidos, mas para a educação destes. E nesta educação, o educador é ele mesmo - o indivíduo se torna sujeito de sua trajetória educativa.



Nesse espírito, a linguagem da contação de histórias se insere na contemporaneidade como um espaço interdisciplinar, ou até mesmo transdisciplinar, em que as experiências trazidas por outras histórias vão se mergulhar com as dos próprios contadores, com a dos próprios participantes-ouvintes, abrindo campos largos de percepção, emergindo uma proposta de mediação cênica com o público, seja essa mediação/participação introjetada ou extrínseca, objetiva ou subjetiva.

História pra quê?


"Não há ninguém tão pobre que não deixe algo atrás de si."

Pascal


Walter Benjamin, em "O narrador" previa a extinção de um sujeito que vem, desde que o ser humano se constituiu como ser de linguagem, tecendo o papel de guardião da memória dos povos: o contador de histórias.

Chegamos ao século XXI e já podemos constatar uma grande lição: ainda bem, Benjamin falou em sua previsão.


Ainda assim, vamos refletir um pouco: na sociedade contemporânea, repleta de elementos que seduzem pelo seu apelo visual, a contação de histórias vem se propor a ser uma linguagem em que se estimula um outro sentido por vezes deixado de lado: a audição.

Porém, não se trata de apenas escutar as palavras, mas de ouvi-las, ou seja, deixá-las nos afetar.

Já foi e continua sendo dito o quanto o excesso do visual, sem a educação deste sentido, produz um embotamento do senso crítico com relação a esse tipo de imagem.

A contação de histórias vem exatamente na contramão disto: o contato entre o contador e seu público é o tempo em que ambos exercitam o músculo da imaginação, provendo-se de construções individuais acerca das palavras que alcançam o seu imaginário.

O visual é bidimensional. Enquanto vejo algo, o que está atrás de um objeto não pode ser visto por inteiro, a não ser que eu me aproxime dele. Ainda que ele seja tridimensional, a visão não o é. Para ver cada lado, é necessário que eu me posicione de acordo com o ponto de vista que eu queira ter do objeto.

O ouvir é distinto: ele é multidimensional. Ao ouvir palavras, estas se transformam em imagens que, no cérebro, transformar-se-ão em terrenos, pelos quais eu posso voar, atravessar paredes, fazendo com que a percepção recaia sobre o todo que constitui a cena narrada.

Ao ouvir, a palavra acessa a memória; a memória emerge experiências vividas; estas e seus valores adjetivos são agregados à palavra ouvida; a compreensão do que se ouve acontece, mas não é inócua: é carregada de sentidos, de conexões cogntitivo-afetivas, as quais trarão um sabor especial àquele momento de encontro trigonal – contador-história-ouvintes.

Ainda, ao ouvir histórias de uma sociedade distinta da que se vive, acontece o encontro entre modos múltiplos de viver a existência e de construção de mundos. Muitas vezes, ao nos deparamos com as diferenças, encontramos mais semelhanças do que nossos (pre)conceitos suporiam.

Memória. Esta vem do grego anamnesis, e seu significado estava além da acepção atual, o recordar – e sim trazer ao presente.

Portanto, o espectador já não é mais assim: ele é participante, pois que há uma história sendo contada por ele mesmo. A sua construção íntima, também, carrega não só as suas experiências, mas agrega valores arquetípicos, vindos de tempos e espaços imemoriais. Como se toda a história da humanidade contivesse-se em um único sujeito.

Portanto, chegamos a uma conclusão: a Contação de Histórias é uma Arte repleta de conceitos de Educação.


Sendo assim, em uma proposta de Educação em que as barreiras da intolerância se rompam e as das hierarquias de saberes sejam relativizadas, a Contação de histórias se estabelece como arte em que, citando Morin, os sete saberes necessários à educação do futuro se fazem presentes: o conhecimento, o conhecimento permanente, a identidade humana, a compreensão humana, a incerteza, a condição planetária e a antropo-ética. Se analisamos qualquer história perceberemos estas dimensões.


Entremear Contação de histórias e Educação é obter mais uma ferramenta pedagógica e artística, a fim de proporcionar experiências estéticas que integrem os sentidos do indivíduo. É oferecer-lhe mais um instrumento de apreciação e crítica do mundo.

Você já ouviu uma história hoje?


Até a proxima história...

Pra conhecer mais... Curriculum

http://mundoazulth.blogspot.com.br/2012/10/curriculum_3.html